Páginas

terça-feira, 21 de junho de 2011

A História recente do Brasil...vista pelo lado de cá.

Você conhece a História recente do nosso país? Esse texto que peguei (com autorização) no FB do Marcelo Fróes é uma aula de História e de Cidadania. A cada linha, revive-se fatos da história recente...mesmo para aqueles que não a viveram. Leiam...muito bom texto mesmo. SE GOSTAREM DIVULGUEM< O MARCELO QUER QUE A CARTA DO CARLOS SEJA DIVULGADA
Em março de 1991, um ano após a posse de Fernando Collor de Mello, o telex do Palácio do Planalto recebeu a seguinte carta, redigida por Carlos Fróes (do Sindicato dos Metalúrgicos de Ouro Branco, MG):


CARTA DOS TRABALHADORES AO PRESIDENTE COLLOR

Ouro Branco, 15 de março de 1991

Presidente Collor,

No dia do 1º aniversário de seu governo, a gente quer pedir desculpas por existir e causar tantos problemas a V. Exa.

V. Exa. e vosso cargo são tão importantes e a gente, insensível, fica atrapalhando. Deve ser muito desagradável para V. Exa. e vossos amigos de caminhadas e Cooper, todas elas com cobertura de jornais e TVs, ter de ficar se preocupando com o povo. Aliás, realmente, povo é apenas um detalhe. Desculpe, se por causa disso, está ficando difícil para V. Exa. igualar seus recordes ou batê-los, passando vexames, por causa da gente.

Os passeios de V. Exa. de jet sky, de moto-contrabandeada, de aviões supersônicos, de submarinos, à Antártida e às Ilhas Seychelles que, diga-se de passagem, – não agradaram muito ao vosso refinado gosto, não tem tido a tranqüilidade que V. Exa. merece.

Não poderíamos também deixar de lamentar as críticas do povo, quando de sua árdua aula de sobrevivência na selva amazônica, onde não havia conforto suficiente para o banquete planejado, ao ar livre, com vossa querida família. E, além do mais, ainda teve que ouvir piadas sem graça e cantorias de um ministro que parece não ter mais o que fazer: também pudera, tinha de ser metido a representante de classe trabalhadora, ou seja, do povo.

Desculpe o vexame que a gente fez V. Exa. passar, ao encontrar tão pouquinho de dinheiro em nossas contas bancárias e na poupança. É que a gente é imprevidente; ao invés de guardar dinheiro, a gente fica gastando com comida, com remédios, com transporte. E ainda tem gente que, mal informada, teima em chamar o empréstimo de confisco.

Desculpe, Presidente, nossa burrice e ignorância, teimando em não entender os planos da equipe econômica do Governo, tão transparentes, claros e auto-explicativos.

Desculpe, Presidente Collor, nossa mania de ficar reclamando sempre em cima da mesma coisa: salário e custo de vida. Não nos leve a mal, isto é coisa de gentinha sem visão, sem cultura, sem patriotismo, que não está interessada nos grandes problemas nacionais e só pensa em si próprio e na família.

A gente tem que entender que é essa nossa mania arcaica de receber salários, que está dificultando a V. Exa. atingir vossos objetivos e estimulando a inflação.

A gente tem a triste mania de trabalhar, trabalhar, trabalhar, sem lembrar que os coitados dos patrões têm uma “baita” despesa com os tais salários e ficam sem poder mandar as excelentíssimas famílias para o exterior várias vezes ao ano, sem poder dar suas recepções e festas, regá-las a champanhe francês e whisky importado, regalando os convidados. Pior de tudo é que eles ainda ficam falando mal de V. Exa, que V. Exa. não cumpre os “tratos”, que chama os automóveis que eles fazem de carroças.... Tudo culpa da gente. Ah, que raiva que a gente tem da gente!

Perdoe-nos, Presidente, porque as nossas crianças são mal educadas e mal criadas, ficam com aquelas carinhas de sem vergonha, como se estivessem com fome, fingindo que estão doentes. Tudo mentira delas, olha só as barriguinhas: tudo “cheinha”, redondinhas mesmo. As pequeninas, de colo, então nem se fala. Deram até pra morrer e criar embaraços para as estatísticas do Governo.

A gente devia era to mar vergonha na cara e ter filhos bonitos e elegantes como os seus. Tem uma coisa que a gente ta envergonhado mesmo: não é que alguns cretinos e maus brasileiros deram pra morrer, em frente a hospitais e nos corredores, só pra denegrir a imagem do Governo de V. Exa.?

Desculpe, Presidente, pela cara do povão. Gente esquisita, magra, viciada em filas – principalmente do INAMPS, fingindo de doente. Cá entre nós; só matando aqueles safados que teimam em não ter casa e, ainda por cima, se intitulam de desempregados. Um pouco da culpa disso fica por conta desse povão que não entende o “espírito da coisa” e quer teimar em continuar acreditando naquela de descalços e descamisados. De outra vez, V. Exa. não se misture com essa gente.

Desculpe pelo embaraço que meia dúzia de três ou quatro estão trazendo aos planos de repassar para a iniciativa privada (eles chamam de entreguismo) as nossas empresas públicas. V. Exa., com justa razão, deve estar muito magoado com essa mania do povo de se intrometer nos seus negócios particulares.

Mas nós queremos, nesta data tão bonita, reparar esses erros todos e desagravar V. Exa:
V. Exa. é o maior... !
V. Exa. é muito corajoso e não tem medo de nada!
V. Exa. é ótimo e muito tranqüilo, basta ver nos olhos!
V. Exa. é muito criativo, principalmente em Planos e Medidas Provisórias, para não falar das Medidas de Aprofundamento!
V. Exa. é bonito e muito inteligente. Aliás, concordamos com D. Rosane, quando ela diz que V. Exa. é o mais inteligente que ela conhece!
As camisetas de V. Exa. são chiquérrimas!

Sem mais, receba nossos abraços, extensivos à Ministra Zélia, ao Kandir e ao Eris e a todos os demais membros do Governo.
Recomendações respeitosas à D. Leda, sra. sua mãe.

Sindicato dos Metalúrgicos de Ouro Branco

(íntegra do telex NR. DDC/049/91 enviado ao Presidente da República, na véspera de seu aniversário – 14 de março de 1991)

Três meses depois desta carta, Carlos Fróes faleceu numa mesa de cirurgia em Belo Horizonte. Foi uma tragédia na minha família. Neste dia 21 de junho lá se 20 anos do ocorrido, e a atualidade desta carta – publicada nos jornais da época – me faz republicá-la em homenagem ao tio que tive o privilégio de ter como padrinho.

Um ano e meio depois Fernando Collor tombou.



Por Marcelo Fróes

Nenhum comentário:

Postar um comentário